Só agora soube que morreu o homem que me chamava "porcaria". Dava-me dois beijos, perguntava-me pela escola e pelo comportamento e nunca se queria sentar.
"Ó Porcaria, tenho de descansar" - explicava ele. Funcionário público toda a vida, 30 anos depois de se reformar ainda as cadeiras lhe pareciam cansativas.
Quando ficou viúvo deixou de ir a minha casa. Apareceu só uma vez para explicar que não podia voltar.
"Só continuo a ir aos sítios onde já antes ia sem ela. Aqui vínhamos sempre os dois, e sozinho não consigo."
Senti-me, claro, vagamente abandonada. Ao fim de tantos anos...adeus? Primeiro ela, que desaparece sem dar explicações. E depois ele, que dá uma explicação que os meus 9 anos não compreendem.
"Ó Porcaria, até logo."
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